tag:blogger.com,1999:blog-20446704314691785702024-03-08T12:08:06.497-08:00Antigos Campos de Cima da Serrapor Luciana Olga SoaresUnknownnoreply@blogger.comBlogger2125tag:blogger.com,1999:blog-2044670431469178570.post-20176909638241213482016-01-18T10:07:00.002-08:002018-05-24T11:10:08.532-07:00<div style="text-align: center;">
<b><span style="font-size: large;">MANIFESTO SERRANO</span></b></div>
<div style="text-align: center;">
<span style="font-size: large;"><br /></span></div>
<div style="text-align: center;">
<span style="font-size: large;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;"> Nós, moradores antigos dos Campos de Cima da Serra, município de São Francisco de Paula - RS, sentimos a necessidade de levar a público a atual realidade de nossa região que vivia basicamente da pecuária extensiva, usando a prática bicentenária da queima do campo para eliminar a macega seca do final do inverno e, com isso, renovar a pastagem.</span><span style="font-size: large;"> </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;"> </span><span style="font-size: large;">O fato desse sistema ser praticado todos os anos fazia com que a palha a ser queimada fosse rala, produzindo um fogo de baixa intensidade, nunca atingindo temperaturas elevadas e, consequentemente, não prejudicando o ecossistema. Da mesma forma, sendo fraco, o fogo se extinguia nas proximidades de lugares úmidos como matos e banhados.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;"> </span><span style="font-size: large;">Ressaltamos que a denominação tradicional de “Queima do Campo” não retrata com fidelidade essa prática, pois tínhamos o cuidado de aproveitar o vento para direcionar a labareda no sentido horizontal, evitando danos ao solo e gerando um fogo muito fraco e muito rápido, queimando somente a palha seca e, portanto, sem produzir brasa, razão pela qual será mais apropriada a denominação de uma simples “sapecada do campo”. Essa característica o fazia completamente diferente das queimadas realizadas nas regiões centro-oeste e norte do Brasil.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;"> </span><span style="font-size: large;">É importante salientar, também, que a cinza possui um caráter alcalino e, por essa razão, colaborava de maneira efetiva para diminuir a acidez do solo, fazendo com que esse se tornasse mais produtivo.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;"> </span><span style="font-size: large;">A afirmação que os fazendeiros derrubaram matas nativas para aumentar o campo não corresponde à realidade, uma vez que a região de Cima da Serra era originariamente campo. Haja vista a pequena camada de terra sobre a rocha* que é característica de solo próprio para gramíneas. Só mais tarde se formaram os capões (florestas de pequena extensão) espalhados por toda a região, formando um mosaico de rara beleza, o que, diga-se de passagem, encantou os portugueses e espanhóis quando aqui chegaram.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;"> </span><span style="font-size: large;">Já em 1822, o renomado naturalista francês, Augusto Saint-Hilaire, em viagem ao Rio Grande do Sul, fez referências elogiosas à paisagem serrana e aprovou o método da “sapecada” como melhor forma da renovação do pasto e do combate às ervas daninhas.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;"> </span><span style="font-size: large;">Além de eliminar ervas invasoras prejudiciais, nossa “sapecada” favorecia o controle do carrapato, sem contar as gramíneas nativas que necessitam do calor produzido pelo fogo para quebrar a dormência em que se encontram suas sementes a fim de que possam germinar, perpetuando, assim, a própria espécie.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;"> </span><span style="font-size: large;">Cumpre lembrar que, no período da “sapecada”, mês de agosto, não há filhotes de animais no campo, porque os ninhos são feitos somente a partir de setembro, início da primavera. Além disso, após essa prática, nunca se encontrou qualquer animal queimado ou asfixiado, razão pela qual ela não ocasionou a extinção de nenhuma espécie animal da região.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;"> </span><span style="font-size: large;">O benefício dessa prática anual, tradicionalmente realizada há mais de duzentos anos, ia muito além da renovação da pastagem e do controle das pragas, pois evitava a existência de macegas altas que se tornam extremamente perigosas por poderem ocasionar incêndios de grandes proporções e, como tal, incontroláveis. Como agravante, é sabido que algumas aves, como o Quero-Quero, conhecido como “Sentinela dos Pampas”, não fazem ninho em macegas altas.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;"> </span><span style="font-size: large;">Outro dado significativo é que o gás carbônico gerado pela queima da vegetação seca é compensado pela fotossíntese realizada pela macega nova que aponta já nos primeiros dias após a “sapecada”. Soma-se a isso que, comprovadamente, as plantas jovens consomem maior quantidade de dióxido de carbono e liberam mais oxigênio no ambiente, garantindo o ar puro.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;"> </span><span style="font-size: large;">A exemplo disso, vale lembrar que, no século passado, pacientes acometidos pela tuberculose vinham, por indicação médica, hospedar-se em hotéis de nossa cidade para usufruírem dos benefícios curativos da boa qualidade do ar serrano.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;"> </span><span style="font-size: large;">Cabe esclarecer que os animais não comem a macega no final do inverno porque ela fica completamente seca, também não realizando fotossíntese e, em decorrência disso, sem condições de colaborar para a pureza do ar.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;"> </span><span style="font-size: large;">Como os Campos de Cima da Serra são dobrados (cheios de elevações) e excessivamente pedregosos, impossibilitam o uso de maquinário para o corte da macega seca, tornando muito difícil, sem a “sapecada”, a continuidade da pecuária.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;"> </span><span style="font-size: large;">Esse contexto gerou a tendência de mudança da atividade econômica, surgindo a monocultura do pínus, a cultura da batata e de hortaliças em geral.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;"> </span><span style="font-size: large;">Queremos deixar bem claro que nossa contestação não se dirige aqueles que se dedicam a estes cultivos, mas contra o impasse em que a lei**, inviabilizando a pecuária, prática econômica predominante da região, “embretou” os pecuaristas que, sem saída, foram forçados a vender suas terras e, até mesmo, por questão de sobrevivência, a usar desses novos recursos.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;"> </span><span style="font-size: large;">Vejamos as consequências desses cultivos.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;"> </span><span style="font-size: large;">O cultivo do Pínus, planta exótica e invasora, tem como consequências:</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;"> </span><span style="font-size: large;"><b>a)</b> acabar com a belíssima paisagem dos Campos de Cima da Serra, podando de maneira empobrecedora e lamentável o potencial turístico da região;</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;"> </span><span style="font-size: large;"><b>b)</b> contribuir fortemente para secar nossos mananciais de água;</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;"> </span><span style="font-size: large;"><b>c) </b>exaurir a terra de seus nutrientes, empobrecendo-a;</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;"> </span><span style="font-size: large;"><b>d)</b> colaborar para o extermínio da fauna e da flora, uma vez que não produz alimentos para os animais e nem condições para que eles se reproduzam, ao mesmo tempo que, sendo invasora, mata toda e qualquer vegetação nativa a sua volta;</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;"> </span><span style="font-size: large;"><b>e)</b> favorecer o extermínio de animais também pela utilização de formicidas que são colocados nas mudas no período do plantio.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;"> </span><span style="font-size: large;">Acrescenta-se, ao exposto, o perigo inevitável e iminente de incêndios espontâneos de grandes proporções, sem nenhum controle, colocando em risco todo o ecossistema da região e todas as formas de vida, inclusive a humana, sem contar os danos materiais que são inevitáveis. São inúmeros os exemplos dessa calamidade que, nos Estados Unidos, arrasam grandes extensões de terras sem que eles, com toda a tecnologia que possuem, consigam deter a tragédia.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;"> </span><span style="font-size: large;">Já a cultura da batata e das hortaliças traz outros prejuízos:</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;"> </span><span style="font-size: large;"><b>a)</b> com <b>a prática de arar</b>, a pequena camada de terra sobre a rocha, com espessura aproximada de 30 cm, sofre uma grande erosão que é agravada pelas irregularidades do terreno. Isso <b>inviabilizará todo e qualquer aproveitamento posterior do solo</b>;</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;"> </span><span style="font-size: large;"><b>b)</b> o uso de agrotóxico nas plantações, tantas vezes abusivo, não só provoca o envenenamento de animais, principalmente de aves, peixes e crustáceos, como também polui nossas nascentes, comprometendo a qualidade da água que, de nossa região, situada a 922 m de altitude, é distribuída para todas as cidades circunvizinhas, já que fazemos parte de cinco bacias hidrográficas.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;"> </span><span style="font-size: large;">Mas o que nos deixa estupefatos é que sempre ouvimos das autoridades que nos multam pela “sapecada” a afirmação que é “imprescindível proteger a natureza”, sendo esta a razão de todas as leis.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;"> </span><span style="font-size: large;">Entretanto, há um silêncio absoluto quanto à destruição do campo. Parece não haver nenhuma lei que o proteja. Os próprios órgãos governamentais regulamentam plantações exóticas e cultivos carregados de agrotóxicos em pleno campo, destruindo-o de maneira profunda.</span><span style="font-size: large;"> </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;"> </span><span style="font-size: large;">E fica conosco a pergunta: - <b>Por ventura não fará o campo parte da natureza?!...</b></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;"> </span><span style="font-size: large;">No aspecto cultural, vemos a Tradição Gaúcha, que por tanto tempo representou tão dignamente a alma do povo do Rio Grande, ser enfraquecida pela proibição da “sapecada” que impõe ao ruralista, além de problemas financeiros, o dissabor de se ver abordado por funcionários, no mais das vezes despreparados, usando de abuso de autoridade, pois chegam em nossas propriedades fortemente armados como se fôssemos criminosos.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;"> </span><span style="font-size: large;">E a triste realidade permanece doída diante de nossos olhos: os lendários Campos de Cima da Serra estão, lamentavelmente, desaparecendo como paisagem e como ecossistema.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;"> </span><span style="font-size: large;">E nós, que amamos esta terra, tememos pela herança que ficará para nossos filhos, pois não compreendemos um viver sem tradição, não compreendemos um viver sem valores verdadeiros que brotem de um trabalho feito em harmonia com a natureza e que contribua para o bem comum.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;"><br /></span></div>
<div style="text-align: center;">
<span style="font-size: large;">GRUPO SERRANO</span><br />
<span style="font-size: large;">_________________________________</span></div>
<div style="text-align: center;">
<span style="font-size: large;">Moradores dos Campos de Cima da Serra</span></div>
<div style="text-align: center;">
<span style="font-size: large;"><br /></span></div>
<div style="text-align: center;">
<span style="font-size: large;"><br /></span></div>
<div style="text-align: center;">
<span style="font-size: large;">São Francisco de Paula de Cima da Serra, 20 de setembro de 2012.</span></div>
<div style="text-align: center;">
<span style="font-size: large;"><br /></span></div>
<div style="text-align: left;">
<span style="font-size: large;">________________________</span></div>
<span style="font-size: large;"><br /></span><span style="font-size: large;">* Aproximadamente 30 cm</span><br />
<span style="font-size: large;">**Lei Estadual nº 9.519/92</span><br />
<span style="font-size: large;"><br /></span>
<br />
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;"><b> Nota:</b> Esse Manifesto representa o conhecimento empírico de diversas gerações que viveram nos Campos de Cima da Serra. Hoje, trabalhos científicos de renomados pesquisadores como Alindo Butzke, Roberto Birch Gonçalves e Alice MariaTrindade Ramos, entre tantos outros, vêm documentar a veracidade dessas informações.</span></div>
Unknownnoreply@blogger.com14tag:blogger.com,1999:blog-2044670431469178570.post-77702275559527754062016-01-18T10:04:00.000-08:002018-05-24T11:09:07.013-07:00<div class="MsoHeader" style="font-size: 20px; font-weight: bold; text-align: center;">
Pronunciamento Câmara de Vereadores de São Francisco de Paula </div>
<div class="MsoHeader" style="font-size: 16px; font-weight: bold; text-align: center;">
Dezembro de 2015</div>
<br />
<br />
<div class="MsoHeader" style="font-size: 20px; text-align: justify;">
Pronunciamento feito na Câmara de
Vereadores de São Francisco de Paula, dia quinze de<a href="https://www.blogger.com/null" name="_GoBack"></a>
dezembro de dois mil e quinze, por
ocasião do pedido da inclusão do Manifesto Serrano nos Anais da Casa</div>
<div class="MsoHeader" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoHeader" style="font-size: 20px; text-align: justify;">
Cumprimento a Mesa, as autoridades
presentes, nossos visitantes, e saúdo a todos os serranos que vieram
compartilhar conosco este momento que, para nós, se reveste de tão profundo
significado. </div>
<div class="MsoHeader" style="font-size: 20px; text-align: justify;">
Venho a esta Tribuna consciente da
responsabilidade que é qualquer pronunciamento nesta Casa que leva o nome de
Elon Wood Duarte Barcelos.</div>
<div class="MsoHeader" style="font-size: 20px; text-align: justify;">
Conheci pessoalmente o Dr. Elon e
sou testemunha, não só de sua honradez, de sua integridade, mas também da forma
como ele exerceu a sua profissão. Jamais o Dr. Elon deixou de atender a um
chamado. A chuva, as geadas, as frias madrugadas, os feriados, nada o impedia de atender com presteza a
todos, sem mesmo cogitar se aquele que o chamava era um homem de
posses, ou alguém que não tivesse um centavo para lhe dar.</div>
<div class="MsoHeader" style="font-size: 20px; text-align: justify;">
O Dr. Elon, sou testemunha, exerceu a
Medicina como um verdadeiro sacerdócio. E tenho certeza também de que, por todos
os lugares por onde andou, ele deixou um rastro fundo de bondade.</div>
<div class="MsoHeader" style="font-size: 20px; text-align: justify;">
Sou portadora do Manifesto Serrano, escrito por antigos
moradores deste município, e que trata, basicamente, da pecuária extensiva e
das profundas modificações do ecossistema causadas pela proibição da
tradicional Queima do Campo.</div>
<div class="MsoNormal" style="font-size: 20px; margin-bottom: 0.0001pt; text-align: justify;">
Em
nome do Grupo Serrano, solicito a inclusão deste documento nos Anais desta
Casa, para que as gerações futuras tomem conhecimento da lamentável realidade
em que se encontra, nos dias de hoje, toda a região de nossos antigos campos.</div>
<div class="MsoNormal" style="font-size: 20px; margin-bottom: 0.0001pt; text-align: justify;">
Peço licença à Mesa para fazer um breve comentário sobre questões
pertinentes às abordadas no Manifesto Serrano.</div>
<div class="MsoNormal" style="font-size: 20px; margin-bottom: 0.0001pt; text-align: justify;">
E
quero iniciar este breve comentário, trazendo palavras de um pensador oriental.
Ele diz assim:</div>
<div class="MsoNormal" style="font-size: 20px; margin-bottom: 0.0001pt; text-align: justify;">
“Existem três coisas que ninguém consegue esconder: o sol, a lua e a
verdade.”</div>
<div class="MsoNormal" style="font-size: 20px; margin-bottom: 0.0001pt; text-align: justify;">
Essas palavras me alegram, me fortalecem e, de certa forma, me tranquilizam,
por que, sem nenhuma dúvida, a verdade se fará ouvir. E um dia, talvez mais
cedo do que se imagina, a insensatez da proibição da Queima do Campo em Cima da
Serra será para todos uma evidência.</div>
<div class="MsoNormal" style="font-size: 20px; margin-bottom: 0.0001pt; text-align: justify;">
É
bem verdade que, ultimamente, algumas vozes têm se pronunciado sobre o equívoco
que se está cometendo no que se refere aos destinos que se vêm dando aos Campos
de Cima da Serra.</div>
<div class="MsoNormal" style="font-size: 20px; margin-bottom: 0.0001pt; text-align: justify;">
Mas, que diferença dessas vozes que vêm de longe para a voz daqueles
que amam esta terra, daqueles que tiveram, nesta terra, as lições mais lindas,
e também as mais profundas; daqueles que têm, neste chão, a sua raiz, o seu
passado, toda a sua História.</div>
<div class="MsoNormal" style="font-size: 20px; margin-bottom: 0.0001pt; text-align: justify;">
Que diferença daquelas vozes tão distantes para a voz daqueles que vivenciaram,
em nossos galpões, a mais larga hospitalidade; daqueles que, ao cair da tarde,
sentiam a alma inundada pela paz que reinava na imensidão de nossos campos,
sentiam a alma inundada pelo silêncio, pela grandiosidade daquele silêncio que
ecoava quase como uma prece...</div>
<div class="MsoNormal" style="font-size: 20px; margin-bottom: 0.0001pt; text-align: justify;">
Ah!
Com que facilidade se admite um equívoco que vem destruindo todo um
ecossistema...</div>
<div class="MsoNormal" style="font-size: 20px; margin-bottom: 0.0001pt; text-align: justify;">
E,
ao falar em destruição, é oportuno lembrar a catástrofe que está acontecendo
nos estados de Minas Gerais e Espírito Santo, estados que estão sendo invadidos
por detritos poluentes gerados por uma atividade econômica.</div>
<div class="MsoNormal" style="font-size: 20px; margin-bottom: 0.0001pt; text-align: justify;">
E,
neste momento, é preciso que se diga, de cabeça erguida e com a voz firme, que
aqui, em Cima da Serra, nestes campos que se estendiam desde nosso município
até Lajes, em Santa Catarina, havia uma atividade econômica que, por mais de
duzentos anos, não gerou qualquer detrito poluente, uma atividade econômica que
nem mesmo lixo produzia. </div>
<div class="MsoNormal" style="font-size: 20px; margin-bottom: 0.0001pt; text-align: justify;">
E é
necessário que nossa cabeça permaneça erguida, e que firme permaneça a nossa
voz, para que as gerações futuras
saibam que esta atividade econômica, a pecuária tradicional, que por mais de
dois séculos não gerou absolutamente nada de detritos poluentes, que esta
atividade econômica não foi contemplada pelos órgãos oficiais com o devido
respeito. E uma lei, uma lei completamente equivocada, uma lei que eu diria
criminosa, inviabilizou a sua continuidade.</div>
<div class="MsoNormal" style="font-size: 20px; margin-bottom: 0.0001pt; text-align: justify;">
Que grande esse equívoco!... Que grande e que lamentável esse equívoco!...</div>
<div class="MsoNormal" style="font-size: 20px; margin-bottom: 0.0001pt; text-align: justify;">
Esse equívoco retirou de nossas vidas o sentido mais amplo, retirou de
nossas vidas o sentido mais profundo. Esse equívoco tirou a base do nosso
conhecimento, daquele conhecimento centenário que aprendemos com os nossos
pais, com os nossos avós, nossos bisavós, e com o qual mantivemos intacto, no
decorrer desses duzentos anos, todo esse ecossistema.</div>
<div class="MsoNormal" style="font-size: 20px; margin-bottom: 0.0001pt; text-align: justify;">
Mas
a lei, aquela lei por demais equivocada, anulou esses ensinamentos de nossos
antepassados e, como decorrência, nossas águas já não são límpidas; como
decorrência, não há mais a beleza de nossos campos.</div>
<div class="MsoNormal" style="font-size: 20px; margin-bottom: 0.0001pt; text-align: justify;">
Esse equívoco colocou, diante de nossos olhos, a perspectiva de um
futuro impregnado de dor, futuro impregnado de uma dor proveniente de
doenças... doenças como o câncer, doenças como o Alzheimer, doenças como o
enfarto.</div>
<div class="MsoNormal" style="font-size: 20px; margin-bottom: 0.0001pt; text-align: justify;">
Esse equívoco colocou em nossas vidas uma angústia doída demais para que
se possa conviver com ela, que é a angústia de ver, a angústia de perceber, dia
após dia, o destroçar de todo um passado, passado em que, certamente,
poderíamos nos apoiar com firmeza para prepararmos um amanhã em que se pudesse
viver com dignidade.</div>
<div class="MsoNormal" style="font-size: 20px; margin-bottom: 0.0001pt; text-align: justify;">
E
nossos passos... nossos passos já perderam a certeza do caminho. Nesta direção,
se deparam com as águas poluídas; nesta
outra, com a morte dos animais; numa terceira, é o câncer , é o Alzheimer... E
ali, logo ali, se fará um deserto...</div>
<div class="MsoNormal" style="font-size: 20px; margin-bottom: 0.0001pt; text-align: justify;">
E,
assim, nossos passos nos conduzem, apenas, para presenciarmos o esfacelamento de toda uma cultura.</div>
<div class="MsoNormal" style="font-size: 20px; margin-bottom: 0.0001pt; text-align: justify;">
Com que naturalidade se aceita um equívoco que vem estragando nosso campo,
desfazendo a nossa paisagem – a mais linda deste planeta!</div>
<div class="MsoNormal" style="font-size: 20px; margin-bottom: 0.0001pt; text-align: justify;">
Com
que leviandade se aceita um equívoco que vem exaurindo nossa terra,
empobrecendo-a para nossos próprios filhos, roubando-a de nossos próprios
netos. </div>
<div class="MsoNormal" style="font-size: 20px; margin-bottom: 0.0001pt; text-align: justify;">
Esse equívoco colocou em nossa alma um inexplicável, um incomensurável
vazio.</div>
<div class="MsoNormal" style="font-size: 20px; margin-bottom: 0.0001pt; text-align: justify;">
Esse equívoco colocou, no fundo de nossa alma, a desesperança...<s><o:p></o:p></s></div>
<div class="MsoNormal" style="font-size: 20px; margin-bottom: 0.0001pt; text-align: justify;">
E as conseqüências se fazem inevitáveis, as conseqüências
se fazem por demais dolorosas:</div>
<div class="MsoNormal" style="font-size: 20px; margin-bottom: 0.0001pt; text-align: justify;">
- o
homem serrano já não tem raiz;</div>
<div class="MsoNormal" style="font-size: 20px; margin-bottom: 0.0001pt; text-align: justify;">
- o homem serrano já não tem identidade.</div>
<div class="MsoNormal" style="font-size: 20px; margin-bottom: 0.0001pt; text-align: justify;">
E a
nossa cerração que, ontem, espalhava tanta beleza na imensidão de nossos campos,
encobre, hoje, tão somente, a ausência dos animais que compunham a nossa
paisagem; nossa cerração que, ontem, naquelas frias madrugadas de agosto,
pontilhava de tantos mistérios aqueles lendários Campos de Cima da Serra, hoje,
encobre, não mais que a ausência do tipo humano próprio desta região – o gaúcho
serrano – o inigualável gaúcho serrano, esse gaúcho que quase não se vê mais,
esse gaúcho que já não mantém a característica mais marcante que tínhamos e da
qual tanto nos orgulhávamos, que era a de sermos uma das cidades mais gaúchas
deste nosso Rio Grande!</div>
<div class="MsoNormal" style="font-size: 20px; margin-bottom: 0.0001pt; text-align: justify;">
Que
as gerações futuras venham a saber desse crime, desse crime hediondo cometido
nos Campos de Cima da Serra.</div>
<div class="MsoNormal" style="font-size: 20px; margin-bottom: 0.0001pt; text-align: justify;">
Muito obrigada </div>
<div class="MsoNormal" style="font-size: 20px; margin-bottom: 0.0001pt; text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="font-size: 20px; margin-bottom: 0.0001pt; text-align: justify;">
Luciana
Olga Soares</div>
<div class="MsoNormal" style="font-size: 20px; margin-bottom: 0.0001pt; text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="font-size: 20px; margin-bottom: 0.0001pt; text-align: justify;">
<br /></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="font-size: 20px; margin-bottom: 0.0001pt; text-align: justify;">
São
Francisco de Paula, 11 de dezembro de 2015 </div>
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